Querido Grupo de Louvor,
Eu aprecio muito a sua disponibilidade e
desejo de oferecer seus dons a Deus em adoração. Aprecio sua devoção e
celebro sua fidelidade — arrastando-se para a igreja cedo, domingo após
domingo, separando tempo para ensaiar durante a semana, aprendendo e
escrevendo novas canções, e tantas coisas mais. Assim como aqueles
artistas e artesãos que Deus usou para criar o tabernáculo (Êxodo 36),
vocês são dispostos a dispor seus dons artísticos a serviço do Deus
Triuno.
Portanto, por favor, recebam esta
pequena carta no espírito que ela carrega: como um encorajamento a
refletir sobre a prática de “conduzir a adoração”. A mim parece que
vocês frequentemente simplesmente optaram por uma prática sem serem
encorajados a refletir em sua lógica, sua “razão de ser”. Em outras
palavras, a mim parece que vocês são frequentemente recrutados a
“conduzir a adoração” sem muita oportunidade de parar e refletir na
natureza da “adoração” e o que significaria “conduzir”.
Especificamente, minha preocupação é que
nós, a igreja, tenhamos involuntariamente encorajado vocês a
simplesmente importar práticas musicais para a adoração cristã que —
ainda que elas possam ser apropriadas em outro lugar — sejam
prejudiciais à adoração congregacional. Mais enfaticamente, usando a
linguagem que eu empreguei primeiramente em Desiring the Kingdom¹, às
vezes me preocupo de que tenhamos involuntariamente encorajado vocês a
importar certas formas de execução que são, efetivamente, “liturgias
seculares” e não apenas “métodos” neutros. Sem perceber, as práticas
dominantes de execução nos treinam a relacionar com a música (e os
músicos) de certa maneira: como algo para o nosso prazer, como
entretenimento, como uma experiência predominantemente passiva. A função
e o objetivo da música nestas “liturgias seculares” é bem diferente da
função e o objetivo da música na adoração cristã.
Então deixe-me oferecer apenas alguns
breves conceitos com a esperança de encorajar uma nova reflexão na
prática da “condução da adoração”:
1. Se nós, a congregação, não
conseguimos ouvir a nós mesmos, não é adoração. A adoração cristã não é
um concerto. Em um concerto (uma particular “forma de execução”), nós
frequentemente esperamos ser sobrepujados pelo som, particularmente em
certos estilos de música. Em um concerto, nós acabamos esperando aquele
estranho tipo de privação dos sentidos que acontece com a sobrecarga
sensorial, quando o golpe do grave em nosso peito e o fluir da música
sobre a multidão nos deixa com a sensação de uma certa vertigem
auditiva. E não há nada de errado com concertos! Só que a adoração
cristã não é um concerto. A adoração cristã é uma prática coletiva,
pública e congregacional — e o som e a harmonia reunidos de uma
congregação cantando em uníssono é essencial à prática da adoração. É
uma maneira “desempenhar” a realidade de que, em Cristo, nós somos um
corpo. Mas isso requer que nós na verdade sejamos capazes de ouvir a nós
mesmos, e ouvir nossas irmãs e irmãos cantando ao nosso lado. Quando o
som ampliado do grupo de louvor sobrepuja às vozes congregacionais, não
podemos ouvir a nós mesmos cantando — então perdemos aquele aspecto de
comunhão da congregação e somos encorajados a efetivamente nos tornarmos
adoradores “privados” e passivos.
2. Se nós, a congregação, não podemos
cantar juntos, não é adoração. Em outras formas de execução musical, os
músicos e as bandas irão querer improvisar e “serem criativos”,
oferecendo novas execuções e exibindo sua virtuosidade com todo tipo de
diferentes trills e pausas e improvisações na melodia recebida.
Novamente, isso pode ser um aspecto prazeroso de um concerto, mas na
adoração cristã isso significa apenas que nós, a congregação, não
conseguimos cantar junto. Então sua virtuosidade desperta nossa
passividade; sua criatividade simplesmente encoraja nosso silêncio. E
enquanto vocês possam estar adorando com sua criatividade, a mesma
criatividade na verdade desliga a canção congregacional.
3. Se vocês, o grupo de louvor, são o
centro da atenção, não é adoração. Eu sei que geralmente não é sua culpa
que os tenhamos colocado na frente da igreja. E eu sei que vocês querem
modelar a adoração para que nós imitemos. Mas por termos encorajado
vocês a basicamente importar formas de execução do local do concerto
para o santuário, podemos não perceber que também involuntariamente
encorajamos a sensação de que vocês são o centro das atenções. E quando
sua performance se torna uma exibição de sua virtuosidade — mesmo com as
melhores das intenções — é difícil opor-se à tentação de fazer do grupo
de louvor o foco de nossa atenção. Quando o grupo de louvor executa
longos riffs, ainda que sua intenção seja “ofertá-los a Deus”, nós na
congregação nos tornamos completamente passivos, e por termos adotado o
hábito de relacionar a música com os Grammys e o local de concerto, nós
involuntariamente fazemos de vocês o centro das atenções. Me pergunto se
há alguma ligação intencional na localização (ao lado? conduzir de
trás?) e na execução que possa nos ajudar a opor-nos contra estes
hábitos que trazemos conosco para a adoração.
Por favor, considerem estes pontos com
atenção e reconheçam o que eu não estou dizendo. Este não é apenas algum
apelo pela adoração “tradicional” e uma crítica à adoração
“contemporânea”. Não pense que isto é uma defesa aos órgãos de tubos e
uma crítica às guitarras e baterias (ou banjos e bandolins). Minha
preocupação não é com o estilo, mas com a forma: O que estamos tentando
fazer quando “conduzimos a adoração?” Se temos a intenção que a adoração
seja uma prática congregacional de comunhão que nos traz a um encontro
dialógico com o Deus vivo — em que a adoração não seja meramente
expressiva, mas também formativa² — então podemos fazer isso com
violoncelos, guitarras, órgãos de tubos ou tambores africanos.
Muito, muito mais poderia ser dito. Mas
deixe-me parar por aqui, e por favor receba esta carta como o
encorajamento que ela foi feita para ser. Eu adoraria vê-los continuar a
oferecer seus dons artísticos ao Deus Triuno que está nos ensinando uma
nova canção.
Sinceramente,
Jamie
________________
Notas:
¹Desiring the Kingdom – Worship, Worldview, and Cultural Formation
(Desejando o Reino – Adoração, Cosmovisão e Formação Cultural) [N. do
T.]
² De acordo com o The Colossian Forum, a despeito de a adoração ser encarada hoje em dia apenas como algo que se vai em direção a Deus (expressão), ao longo da história ela sempre foi encarada também como a causadora de algo em nós (formação). “A adoração cristã é também uma prática formativa justamente porque a adoração também é um encontro ‘descendente’ no qual Deus é o atuante primário” (Fonte: http://www.colossianforum.org/2011/11/09/glossary-worship-expression-and-formation/). [N. do T.]
² De acordo com o The Colossian Forum, a despeito de a adoração ser encarada hoje em dia apenas como algo que se vai em direção a Deus (expressão), ao longo da história ela sempre foi encarada também como a causadora de algo em nós (formação). “A adoração cristã é também uma prática formativa justamente porque a adoração também é um encontro ‘descendente’ no qual Deus é o atuante primário” (Fonte: http://www.colossianforum.org/2011/11/09/glossary-worship-expression-and-formation/). [N. do T.]