A divulgação dos dados religiosos do Censo Demográfico 2010, realizado
pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), surpreendeu
até os mais ufanistas dos crentes. O anúncio, no fim de junho, de que o
número oficial de evangélicos no Brasil, agora, é estimado em 42,3
milhões de pessoas – ou 22,2% da população nacional – confirma a
tendência de crescimento vertiginoso do segmento, acelerado nos anos
1980 e 90, mas que parecia ter perdido o ímpeto. Isso equivale a dizer
que, de cada cinco brasileiros, um ou dois se declaram evangélicos. É
muita coisa. Nos últimos dez anos, a Igreja Evangélica nacional cresceu
mais de 6 pontos percentuais, o que configura um fenômeno religioso
jamais visto na história do país. E isso, apesar de todos os
questionamentos que as instituições religiosas têm enfrentado nos
últimos anos, da perda de credibilidade de diversas denominações, dos
escândalos envolvendo pastores famosos e do avanço do secularismo na
sociedade. Para se ter uma ideia, o Censo também constatou que o grupo
dos que se declaram ateus, agnósticos ou sem religião já conta com 15
milhões de pessoas.
Embora ainda pareça utópico dizer que o número de evangélicos vai
superar o de católicos até meados deste século, o fato é que a Igreja
Romana continua assistindo a uma debandada de fiéis. Praticamente
absoluta no fim do século 19, quando seguida por quase 99% dos
brasileiros, a fé católica, hoje, é professada por 65% dos brasileiros,
ou 123 milhões de almas. O Brasil ainda é o maior país católico do
mundo, mas o declínio progressivo preocupa o Vaticano. “Nós já
esperávamos que houvesse queda no número de católicos, mas nossa
expectativa era que fosse menor”, admite o padre Thierry Linard de
Guertechin, do Instituto Brasileiro de Desenvolvimento, entidade ligada à
Conferência Nacional dos Bispos do Brasil, a CNBB. No entender do
religioso, que também é demógrafo, várias causas têm contribuído para
isso. “Parte da responsabilidade é da própria Igreja Católica, que não
vai aonde o povo está”, aponta. Guertechin lembra que as igrejas
evangélicas são mais capilarizadas. “Os fiéis não encontraram a Igreja
nas periferias das metrópoles, como Rio de Janeiro e São Paulo, para
onde acorreu o fluxo migratório das últimas décadas.”
“Em muitas paróquias católicas, a relação é de um padre para 20 mil
fiéis ou mais. A falta de vocações e o envelhecimento do clero agravaram
esse quadro, tornando mais difícil o pastoreio numa sociedade
massificada”, opina o teólogo e pastor luterano Martin Weingaertner,
membro do Conselho de Referência da Aliança Cristã Evangélica
Brasileira. “Em contraposição, as igrejas evangélicas têm em média um
obreiro para cada 100 fiéis, o que possibilita o que poderíamos chamar
de ‘atendimento personalizado’”. Coordenador do Grupo de Trabalho sobre
Igreja, Sociedade e Cidadania da Aliança, o pastor Weingaertner não
acredita, contudo, que a Igreja Evangélica continue a avançar no ritmo
atual e que possa superar numericamente a Católica. “Pela segmentação
interna dos evangélicos, bem como por sua inclinação para a autofagia, a
curva de crescimento deve diminuir. As igrejas evangélicas jamais
chegarão a desempenhar um papel hegemônico, pois isso requereria uma
organização hierárquica ou uma moldura doutrinária uniforme e rígida.”
“GUARDIÕES DA FÉ”
A ênfase do trabalho evangélico em grupos específicos, como crianças e
jovens, é apontada pelo pastor Fernando Brandão, da Junta de Missões da
Convenção Batista Brasileira, como outro fator de atração e fidelização
das igrejas evangélicas. Além, é claro, da presença midiática. Desde os
anos 1980, igrejas e líderes evangélicos, sobretudo os de linha
pentecostal e neopentecostal, tornaram o Evangelho um produto de massa.
“O uso dos meios de comunicação, como rádio e TV, foi determinante para a
expansão do protestantismo no Brasil”, destaca Brandão.
Para o vice-diretor de Expansão Missionária da organização Servindo
Pastores e Líderees (Sepal) e pastor da Igreja Presbiteriana
Independente Oswaldo Prado, não de pode deixar de levar em conta,
também, a popularização da mensagem que prioriza a bênção material: “As
igrejas têm alcançado muitos que precisam de alento e encorajamento no
meio da luta pela sobrevivência. Para isso, muitos têm criado o dualismo
da conversão com uma inevitável ascensão social”. Prado, contudo,
acredita que tributar tanto crescimento apenas à pregação da
prosperidade é simplificar demais a análise. “Seria injusto classificar
apenas esses movimentos como propulsores do crescimento evangélico em
nosso país. Existem aqueles que optaram por estender o Reino de Deus em
nosso país com absoluta seriedade e compromisso com os valores da
Palavra do Senhor. São estes que têm sido os guardiões da fé cristã em
nosso solo”, conclui. (Carlos Fernandes)
ESTATÍSTICAS
Religião no Brasil
123 milhões de brasileiros (64,4%) são católicos
42,3 milhões, ou 22.2%, são evangélicos
15 milhões se declaram sem religião, ateus ou agnósticos
3,8 milhões professam o espiritismo
570 mil são adeptos da umbanda e do candomblé
Top 3
Entre os países com maior presença evangélica em números absolutos, o Brasil aparece em 3º lugar:
1º – Estados Unidos, com 155 milhões de evangélicos e protestantes
2º – China, com 100 milhões (número estimado)
3º – Brasil, com cerca de 42 milhões
Por Carlos Fernandes